Em 86 anos de OAB, Márcia Negrisoli ganha destaque ao ser a primeira mulher a assumir um cargo cobiçado de gestão: o de presidente da instituição. Essa notícia não deveria chamar a atenção, mas, diante de dados que comprovam que a desigualdade no mercado de trabalho ainda existe, convidamos a advogada para uma entrevista sobre as dificuldades da mulher em assumir cargos altos diante do machismo enraizado na sociedade.
Graduanda em Direito desde 2001, Negrisoli teve uma longa trajetória até ocupar a função de presidente da Ordem, passando pela coordenação da Comissão de Direito Empresarial em 2009; Comissão da Mulher Advogada e Vice-Presidente.
A presidente conta que, quando uma mulher assume cargos de gestão, sempre existe a necessidade de reafirmar sua capacidade. “É muito comum o questionamento se a mulher dará conta, já que precisa dividir o seu tempo com inúmeras atribuições, sobretudo no que envolve o cuidado, seja com as crianças e idosos da família, seja com os afazeres domésticos”.
A jornada de trabalho continua após o expediente
De acordo com o estudo Estatísticas de Gênero do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), ainda que as mulheres trabalhem, em média, três horas a mais por semana que os homens – considerando o trabalho remunerado e os afazeres domésticos e familiares – a remuneração é cerca de 76,5% do rendimento deles.
Márcia também relata que, apesar do número de homens e mulheres ser bastante equilibrado no exercício da advocacia, elas têm dificuldades de serem ouvidas, de alcançarem cargos de chefia, de equiparação salarial. “A luta hoje é pela igualdade de oportunidades. Sempre conquistei meu espaço através de muito trabalho. Demonstrando a capacidade para assumir os cargos, com dedicação e respeito ao próximo. Penso que essa conduta afastou qualquer tentativa de machismo que pudesse existir”, conta.
A luta pela igualdade de direitos vem de muito tempo, e cada conquista deve ser valorizada.
A advogada enxerga sua posição como uma mudança de paradigma. “É um novo olhar para nossa Instituição, mas sobretudo a representatividade das advogadas militantes, que se equiparam ao número de homens na profissão”.
Em 27 anos, desigualdade entre gêneros no mercado de trabalho diminuiu menos que 2%
A Organização Mundial do Trabalho (OIT) confirma que atualmente as mulheres ainda têm menos oportunidades. Muitas conquistas já foram alcançadas graças ao perfil combativo das mulheres e, apesar da disparidade salarial ainda ser uma pauta constante de discussões sobre a igualdade de gênero, a luta está longe de acabar.
De acordo com a OIT, a probabilidade de uma mulher trabalhar é de 26% inferior que a de um homem. “Já não se pode afirmar […] em nenhuma região e nem com relação a nenhum grupo social, que as diferenças quanto a emprego entre homens e mulheres acontecem porque as mulheres não querem trabalhar fora do lar”, disse a chefe da Área de Gênero, Igualdade e Diversidade da OIT, Shauna Olney, em entrevista coletiva.
O machismo também interfere na representatividade das mulheres em cargos altos e de maior importância, sendo questionadas sobre a capacidade de executar as funções, entre outros problemas. Segundo o mesmo estudo, somente 39,1% dessas ocupações são feitas por elas e a diferença ficava ainda maior conforme a faixa etária, podendo chegar a 31,8% entre pessoas de 60 anos ou mais.